Perfil – Aldo Rebelo

Mar 14 2004
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Correio Braziliense

Correio Braziliense, 14/03/2004
Perfil – Aldo Rebelo

Capitão Algodão
Cresce a importância do sereno ministro da Coordenação Política

Há um ano, nenhum político apostava as suas fichas no então líder do governo
na Câmara, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Oriundo de uma bancada de oito
parlamentares, era tratado como um comandante sem tropa. O poder estava nas
mãos dos líderes de cada bancada. Com paciência, serenidade e muito, muito
jeito, o alagoano de 47 anos virou o jogo. Fora do furacão que se abate
sobre o PT e com trânsito em todos os partidos, o ministro da Coordenação
Política, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), conseguiu em dois meses e meio no cargo
transformar-se no escudo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no plano
político e, diante das novas denúncias, terá muito trabalho pela frente.

Na Esplanada e no Congresso, a maioria dos políticos aposta hoje que se Aldo
não estivesse no governo, o estrago da crise Waldomiro Diniz poderia ter
sido ainda pior. Recém-chegado na função, ele ganhou um presente de grego
(Waldomiro como funcionário). Sem ele, porém, a crise poderia paralisar
ainda mais o governo, afirma o vice-líder do governo, Beto Albuquerque
(PSB-RS). Foi o ministro da Coordenação Política que alertou o presidente
sobre os problemas e desconfianças mútuas que começaram a contaminar o
núcleo de governo. E hoje funciona como um algodão entre os cristais
petistas que cercam o presidente, segundo contam os deputados e até
senadores – uma seara até então meio distante.

A conquista desse espaço não foi por acaso. Quando chegou ao Palácio do
Planalto, Aldo seria um apoio para aliviar a carga de trabalho sobre o
ministro da Casa Civil, José Dirceu. Na primeira semana, no entanto, amargou
o isolamento. Embora Dirceu tenha enviado uma carta a todos os parlamentares
recomendando que eles passassem a procurar o novo ministro a partir daquele
momento, ninguém levou a sério. Todos continuaram em busca do super Dirceu.
Mas o chefe da Casa Civil despachou todos. Foi o que fez com que na segunda
semana, a agenda de Aldo já estivesse abarrotada com 20 pedidos de audiência
por dia.

Estranho no ninho


Mas dentro do Palácio ainda era considerado um estranho no ninho. Seu peso
no governo começou a aparecer no próprio dia 13 de fevereiro, quando a
revista Época divulgou a fita em que o ex-assessor Waldomiro Diniz pedia
propina ao empresário do jogo Carlos Cachoeira, Aldo foi a voz prática da
reunião. Passou a maior parte do tempo calado, até cobrar uma resposta
rápida, que entrasse nos jornais do meio-dia. Anunciou-se que o assessor
estava demitido e que a PF apuraria o caso. Hoje, não deixa de participar de
uma só audiência do presidente com políticos dos mais variados partidos.

As qualidades pessoais conquistadas ao longo de sua carreira política
ajudaram bastante. O jeito simples vem de berço. O ministro nasceu em Viçosa
(AL). Seu pai foi vaqueiro nas fazendas de Teotônio Vilela, pai do senador
Teotônio Vilela filho (PSDB-AL). Aos 21 anos, mudou-se para São Paulo,
deixando o curso de direito incompleto na Universidade de Alagoas, onde
estudou de 1975 a 1978. Nessa época, dedicado ao jornalismo, o ministro já
estava apaixonado pelo movimento estudantil. É ligado ao PCdoB desde 1976,
mas como o partido era clandestino na época, a primeira filiação partidária
foi o PMDB, em 1980, quando era presidente da União Nacional dos Estudantes
(UNE). Voltou ao PCdoB em 1985.

Seu partido sempre viveu às turras com o PT na base, nos sindicatos e no
movimento estudantil, mas, eleitoralmente, sempre estiveram juntos, daí a
proximidade que lhe garantiu a escolha para a liderança do governo – uma
forma de premiá-lo por não ter sido ministro da Defesa, e também para evitar
que a liderança tivesse a cara do PT. Com um líder neutro, seria mais fácil
contornar as divergências do PT com os demais partidos da base.

Discreto na vida pessoal e na política, Aldo não comenta suas conversas com
o presidente nem mesmo com assessores mais próximos. Casado há 19 anos com a
jornalista Rita Poli, com quem tem um filho de nove anos, Pedro, evita
badalações em Brasília. Nos últimos tempos, por causa da crise, até mesmo os
habituais jantares da corte tem sido evitados. Dedica-se às conversas
políticas e à montagem de uma agenda que possa tirar o governo do atoleiro.

Agenda


Com os aliados na Câmara, fez duas reuniões depois das denúncias, para
construir uma agenda que não fosse a repetição do problema na rua. Na
primeira, foi ao Congresso encontrar-se com os líderes. Na segunda, os
aliados foram ao Palácio, quando discutiram a distribuição das comissões.
Conseguiu um clima tranqüilo entre os deputados, mas não solucionou o
problema. Os líderes dizem que o momento de paz é reflexo do tempo que ele
esteve na liderança, quando construiu um bom grau de coesão entre os
líderes, comenta Beto Albuquerque. Sua passagem pela liderança do governo
é elogiada. Ele é tranqüilo e equilibrado, mas quando tem de jogar duro,
joga duríssimo, avalia o líder do PSB, Renato Casagrande (ES).

Defensor da língua portuguesa (tem projeto para proibir estrangeirismos no
Brasil), é também grande admirador de grandes líderes políticos. Um dos mais
citados é Floriano Peixoto, capaz de evitar uma guerra civil e consolidar
a República no Brasil, citou, em seu discurso de posse. Apesar do passado
de combate à ditadura militar, aproximou-se dos militares. Sobre a relação
com os militares, costuma brincar: Sou o único comunista que é
positivista. Uma máxima de Aldo em termos de política é de que é preciso
esquecer o passado. Ele cita sempre o caso de Prestes com Getúlio Vargas.
Apesar de Getúlio ter assassinado sua esposa, Olga Benário, Prestes acabou
por apoiá-lo. É preciso não olhar para trás para não virar estátua de
sal, prega.

Apesar do semblante sério, Aldo sempre tem uma piada ou uma história
engatilhada para distender o clima nas reuniões. Nessa mesma audiência com
os gaúchos, conteve a ira do deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), que
ameaçava repetir Getúlio, com uma brincadeira: Espero que a sua
referência seja ao Getúlio de 1930, que amarrou os cavalos no Rio de
Janeiro, e não ao Getúlio de 54, que se suicidou, afirmou com um sorriso,
provocando uma gargalhada geral. Aldo terá que recorrer muito às tiradas de
humor diante das nuvens que insistem em permanecer sobre o Palácio do
Planalto.