Mais da mesma coisa

Mar 25 2005
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Zero Hora

Zero Hora, 25/03/2005
Mais da mesma coisa

JÚLIO MARIANI/ Jornalista

Quando se pensa que o Brasil está mudando para melhor, eis que os políticos se encarregam de nos mostrar que continua tudo igual. Foi o caso da votação, na Câmara, do destaque que autoriza a inclusão de três categorias de funcionários do Executivo – delegados, fazendários e advogados do Estado – entre aqueles que poderão se beneficiar do subteto mais alto do Judiciário. A conta não será paga pela União, mas pelos Estados. No caso do Rio Grande do Sul e da maioria dos outros entes federativos, a quase totalidade dos recursos recolhidos já é destinada ao pagamento de funcionários ativos e inativos. Se a regra não for rejeitada pelo Senado, virá aí mais um pouco da mesma coisa. Isto é, terá seguimento a velha história de que algumas categorias profissionais descobriram a fórmula para mamar para sempre nas gordas tetas dos cofres públicos.

A impressão que se tem é de um salve-se-quem-puder: neste país em que os serviços mantidos pelo Estado funcionam precariamente e em que boa parte da população é miserável, quem pode trata de se colocar acima do bem e do mal por meio do caminho mais fácil, ou seja, arrancando o máximo possível do próprio Estado. E o impressionante é que gente de esquerda vote a favor de uma medida dessas, certamente no pressuposto de que se trata de beneficiar… trabalhadores! É triste ver parlamentares que supostamente deveriam defender os interesses da população mais pobre, como é o caso dos gaúchos Adão Preto, Henrique Fontana, Luciana Genro e Maria do Rosário, se posicionarem ao lado da nova mamata. Na bancada rio-grandense, apenas o deputado Beto Albuquerque, do PSB, teve a dignidade de votar contra o subteto.

Que tipo de ideologia é essa que impulsiona uma pseudo-esquerda a votar em favor da apropriação do Estado por algumas parcelas do funcionalismo? Em que capítulo das cartilhas marxistas foram buscar inspiração para trabalhar sistematicamente no sentido da ampliação do abismo que separa ricos e pobres no país? O Brasil já se coloca entre as mais injustas distribuições de renda do planeta, fato que está na raiz da brutal criminalidade que transformou a vida do brasileiro numa quase-morte cotidiana. Ainda assim, vota-se irresponsavelmente em favor de medida que agravará um quadro já deficitário das contas públicas.

A bancada gaúcha na Câmara, com a exceção do deputado Albuquerque, mostrou uma visão limitada e mesquinha das questões sociais. E os deputados do PT contribuíram para o desânimo dos que imaginavam o país em nova etapa a partir do momento em que o grupo ora no poder federal reviu a puerilidade de posições anteriores, típicas de uma oposição sistemática, e propôs a reforma da Previdência. Mas não apenas eles: gente com experiência de governo, que se supunha capaz de votar com racionalidade qualquer tipo de matéria, como é caso dos deputados Alceu Collares, Nelson Proença e Yeda Crusius, colocaram-se no lado mais fácil do problema.

Parece que o Brasil continuará o mesmo nos próximos anos, sejam quais forem os partidos que venham a alcançar o poder.