Sem acordo, vale a alta do imposto

Mar 31 2005
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Jornal O Globo

Jornal O Globo, 31/03/2005
Sem acordo, vale a alta do imposto
 
DOMANDO O LEÃO
Governo não consegue projeto para unir base e recorre de novo à obstrução no Congresso

Incapaz de fechar um acordo com a base aliada em torno do texto de um projeto de lei alternativo – que corrija a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física, mas também garanta medidas de compensação para a perda de receita – o governo obstruiu novamente ontem a votação da Medida Provisória 232 e tentará fazer o mesmo hoje, Com isso, a votação só deve aconteder na próxima semana. Como conseqüência, amanhã, dia 1º de abril, entram em vigor todas as medidas que impliquem em aumento da carga tributária para os prestadores de serviço e agricultores.

A correção de 10% da tabela do IR para os assalariados, no entanto, estaria assegurada até a próxima votação. A MP 232, editada em 31 de dezembro de 2004, aumentou ainda de 32% para 40% a base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e do IR para os prestadoras de serviço que declaram pelo lucro presumido. Também determinou a cobrança na fonte de 1,5% de IR de agricultores e outros prestadores, como hospitais e transportadoras.

Só novo texto pode impedir aumento

Para permitir que essas alterações não entrem em vigor, o governo precisa editar hoje uma medida provisória mudando a data de início da cobrança. Ele já fez isso duas vezes, com as MPs 237 e 240, mas ontem não havia indicação concreta de que essa seria a opção desta vez.

Sem a certeza dos votos para derrubar o requerimento da oposição que garante a aprovação separada do reajuste da tabela do IR, os governistas entraram novamente em ostrução, derrubando a sessão de votação por falta de quórum.

— A estratégia do governo é ganhar tempo para que a MP entre em vigor a partir desta sexta-feira, com o conseqüente aumento da carga tributária. Com o fato consumado, fica muito difícil aprovar um projeto de decreto legislativo para derrubar ou mudar essa cobrança — acusou o deputado Pauderney Avelino (PFL-AM).

Segundo um dos líderes governistas que comemorou o sucesso do adiamento, o governo não tinha nada a perder, pois já estava desgastado com a obstrução do dia anterior e agora pode tentar forçar a oposição a entrar em negociação. Principalmente com a iminência de a MP entrar em vigor amanhã.

— Vale a pena o desgaste. A sociedade não quis a 232, mas quer a parte boa dela. O governo quer derrotar tudo e construir uma saída alternativa, mantendo compensações. Tivemos que ganhar tempo para salvar a parte boa da MP — disse o líder do PTB, José Múcio Monteiro (PE).

É uma queda-de-braço política para ver quem sairá como o autor da saída para a correção da tabela do IR da pessoa física, se a oposição ou o governo. O governo não quer quer o pai da medida seja a oposição.

— Queríamos rejeitar a MP 232 desde terça-feira, para evitar que entrasse em vigor. Mas eles querem criar o caos. Infelizmente tivemos que optar pelo caminho da obstrução — discursou o vice-líder do governo, Beto Albuquerque (PSB-RS).

Após um dia de negociações no Congresso, com Jorge Rachid, da Receita Federal, e com o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernardo Appy, os líderes governistas chegaram ao plenário para votar sem acordo sobre um texto alternativo. Por meio de um requerimento de adiamento da pauta, por votação nominal, os governistas conseguiram esvaziar o quórum, derrubando a sessão e impedindo votar o requerimento de fatiamento da correção da tabela.

Com o PMDB dividido, o apoio do PP, do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, foi essencial para o sucesso da obstrução. Só 185 deputados da oposição registraram o voto no painel, quando eram necessários 257 para prosseguir a votação. Às 19h20m, Severino encerrou a sessão, convocando outra para hoje às 14h.

— Depois desse espetáculo do PMDB, se o governo não der uma mão, está perdido. O governo investiu tudo no PMDB (com mais ministério) e agora está tendo o troco — ironizou o líder do PP, José Janene (PR), que orientou a bancada a seguir a estratégia do governo.

PMDB se mostra dividido em plenário

O líder do PMDB, José Borba (PR), orientou a bancada a seguir o governo, mas o deputado Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) foi ao microfone e convocou a bancada a votar contra o adiamento, acirrando a divisão. Além do PP, entraram em obstrução PL, PTB, PSB, PCdoB, PV, e PT. O porta-voz da Presidência, André Singer, disse que Lula confia nas negociações conduzidas pelos líderes na Câmara na busca de uma solução para a MP.

– O presidente achou importante os esforços dos líderes nas negociações com os deputados e acredita que o Congresso vai encontrar o melhor caminho para não prejudicar os trabalhadores nem o ajuste fiscal que o país vem buscando com esforço e responsabilidade – disse o porta-voz.