Vinho socialista em Caxias

Apr 30 2005
(0) Comments

O Pioneiro – Caxias do Sul

O Pioneiro – Caxias do Sul, 30/04/2005
Vinho socialista em Caxias
 
Deputado federal Beto Albuquerque e o presidente do PSB gaúcho, Caleb de Oliveira, produzem vinho na cidade
 
Caxias do Sul – O rótulo é simples e a garrafa, tradicional. Nela, um conteúdo diferente: uma bebida socialista. Fra Bartolommeo é o nome do vinho produzido na Serra gaúcha pelo deputado federal e vice-líder do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Beto Albuquerque (PSB), em conjunto com o ex-candidato à prefeitura caxiense e presidente do PSB gaúcho, Caleb de Oliveira, e o funcionário público e ex-secretário de Administração do ex-prefeito Pepe Vargas (PT), José Bianchi (sem partido).

Na sexta-feira, o parlamentar, acompanhado dos dois sócios, desembarcou na cidade para conferir in loco o resultado das safras 2004 e 2005. Beto, que é filho de pai português e mãe italiana, foi até a localidade de São Valentin da 2ª Légua, a 20 quilômetros do centro de Caxias, para ver se a produção engarrafada em 2004 permanecia descansando nas pipas.

– Até acho que o (José) Bianchi está vendendo meus vinhos, porque a propriedade está crescendo – brincou Beto logo que colocou os pés na cantina da família Antônio Bianchi (já falecido), onde ocorre a elaboração da bebida.

Em seguida, solicitou:

– Quero uma luz para ver se minhas garrafas estão ainda aqui. Tem pouca coisa, dá até para contá-las.

Ao afastar a cabeça de dentro da pipa para receber das mãos de Bianchi uma taça de vinho novo, o deputado afirmou:

– Está agarrando gosto, corpo – avaliou, em referência ao produto que só será engarrafado em 2006.

Análise do setor

O brinde e a degustação fizeram Beto e Caleb recordar que a idéia de se juntar para elaborar o vinho surgiu, sem compromisso, em 2003. Para a primeira fabricação, optaram pela uva campeã do concurso de melhores uvas da última Festa da Uva, colhida nos parreirais do viticultor Antônio Mazzuchini. A produção de 2004 envolveu 1,8 mil quilos da fruta e rendeu 1,4 mil garrafas de vinho, quantidade que se repetirá em 2005.

– Na época, pagamos R$ 2,40 o quilo da uva. Agora, pegamos uma uva mais barata, de Garibaldi, a R$ 0,80 o quilo – conta Beto, acrescentando que o custo de uma garrafa neste ano fechou em R$ 2,50.

– Se para nós, que fizemos vinho para consumo próprio, utilizando tudo modesta e artesanalmente, custa isso, imagina para as pequenas cantinas, que precisam investir numa aparência melhor, na divulgação, e em outros gastos? – comparou, dando início à avaliação das dificuldades do setor.

O deputado reconhece que a tributação é um dos fatores que encarecem o preço final do vinho brasileiro – os impostos abocanham mais de 42%, segundo o Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin). No entanto, Beto sustenta que não adianta aliviar a carga tributária se as vinícolas não ampliarem a produtividade. O parlamentar defende uma maior escala produtiva, o que, na sua opinião, dissiparia a despesa de cada garrafa, barateando o custo a quem produz.

– Temos de desmistificar a idéia de o vinho ser uma bebida só de inverno. Os restaurantes não podem querer 100% de lucro. Além disso, é preciso aumentar o consumo per capita de vinho, criando um hábito na população. Eu, seguindo o que disse o Lula, estou fazendo a minha parte. Se eu beber mais um copo hoje, não cumpro a agenda, fico por aqui e, mais um pouco, começo a cantar La Verginella (A Virgemzinha) – descontraiu.

Sede de barris novos

Durante o coquetel servido ao meio-dia, que os Bianchi providenciaram para recebê-lo em sua colônia, Beto não poupou elogios à Serra gaúcha. Destacando rótulos de várias cantinas da região, confessou sua preferência pelos varietais, admitindo não gostar muito dos vinhos comuns, feitos, por exemplo, à base de uva isabel e bordô.

Bem à vontade, o parlamentar conversou com os integrantes da família anfitriã, visitou as videiras, propôs ampliá-las para o plantio da uva tipo Cabernet e falou do desejo de adquirir barris de carvalho.

– Seria interessante "amadeirar" (maturar) o vinho. Já propus ao Caleb e ao Bianchi. É baratinho. Cada barril usado custa R$ 500, mas gringo é gringo – brincou, referindo-se à fama de pão-duro dos italianos.

Por surpresa, recebeu um aceno positivo do sócio, que acabou pedindo uma saudação a quem realmente cuida, diariamente, do cultivo da uva e do amadurecimento do vinho. Bianchi destacou que a cantina do local nasceu em 1890 e hoje está desativada comercialmente, mas continua sendo conservada pelos familiares.

– Peço um brinde às pessoas que trabalham dia-a-dia para cultivar e propiciar esses momentos de prazer – discursou o ex-secretário municipal, agradecendo, principalmente à atuação dos irmãos Orvindo, Orlando e Luis Carlos Bianchi.

Beto revela que parte da cota que lhe compete é usada para presentear amigos, colegas e jornalistas em datas especiais. Questionado se pretende expandir a escala de industrialização do Fra Bartolommeo, o socialista, em coro com os sócios, disse que não há, inicialmente, essa intenção. O objetivo é o prazer de acompanhar a fabricação e de experimentar um vinho próprio.

– Bebemos vinho, gostamos de vinho. É só um hobby – afirmou Caleb.

– Mas, se esse negócio der certo, de repente… – completou Beto, sem descartar a possibilidade de uma eventual aposta na comercialização, aperfeiçoando o rótulo e requintando o frasco que leva o nome de um pintor renascentista.