Policiais como prova
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O Pioneiro – Caxias do Sul
O Pioneiro – Caxias do Sul, 23/01/2005
Policiais como prova
Integrantes da linha de frente na guerra civil do trânsito brasileiro, policiais civis, rodoviários e militares ganharam uma injeção de ânimo esta semana. E o Código de Trânsito Brasileiro, um reforço de peso. É que o Congresso aprovou uma lei que concede ao depoimento de policiais e agentes de trânsito o status de prova contra a embriaguez ao volante, caso o motorista se recuse a passar por testes de consumo de álcool. O projeto, de autoria do deputado federal Beto Albuquerque (PSB), precisa ainda ser sancionado pelo presidente para vigorar.
Muitos motoristas se recusam a fazer teste de bafômetro, alegando que não podem produzir prova contra si. A Constituição os ampara. O novo projeto prevê que a embriaguez poderá ser comprovada por notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor. Se depender de especialistas, o apoio à nova lei está garantido.
– Agora a palavra do policial, que tem fé pública, poderá contrabalançar a falha repressiva que transformou o teste do bafômetro em uma opção para o motorista, quando deveria ser uma obrigação – destaca João Fortini Albano, doutor em transportes e professor da UFRGS.
Punições aos motoristas infratores
Condutores podem sofrer dois tipos de punição administrativa. Uma delas, pecuniária, é a multa. A outra, reservada a casos mais graves, é a suspensão do direito de dirigir, por curto ou longo prazo (até cinco anos, que se chama cassação).
MULTAS
No caso das multas, existem três instâncias de recurso contra autuações: a primeira, chamada Coordenadoria de Defesa de Autuação. A segunda, depois de emitida a multa, a Junta Administrativa de Recursos de Infrações (Jari ). E a terceira, caso indeferidos os demais, o Conselho Estadual de Trânsito (Cetran), cujo recurso deve ser feito após pagamento. Todas são analisadas por funcionários do Detran. Como está a situação:
No campo da coordenadoria, instância criada há um ano, existem 15 mil defesas para serem analisadas. O Detran tenta atualizar o serviço, avaliando 40 por dia. A estimativa é de que leve um ano para colocar em dia o trabalho, sem contar as novas defesas que chegam.
Nas Jaris e no Cetran, o serviço está em dia (o processo é despachado no mesmo mês).
SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR
É nos processos de casos mais graves e posteriores às multas, os SDD (Suspensão do Direito de Dirigir), que acontece o maior atraso no trabalho do Detran. Eles se dividem em dois tipos: por excesso de pontuação na carteira do motorista (acima de 20 pontos) ou por infrações graves (tipo embriaguez e outros 17 tipos). A situação: Desde julho de 2003 o Detran não julga os SDD referentes a motoristas com excesso de pontos na carteira. Como ali se misturam infratores por questões banais e outras nem tanto, a prioridade foi para os SDD referentes a infrações graves. O cálculo é de que estejam atrasadas 42,5 mil análises de processos por excesso de pontuação.
Deveriam ter sido abertos 40 mil SDDs por infrações graves em 2005, mas só 1,5 mil se concretizaram. Os demais têm se acumulado por falta de pessoal para analisar os processos.
Lei há, o que falta é punir
CTB faz 8 anos e já beira descrédito
HUMBERTO TREZZI/ Agência RBS
Porto Alegre – O Código de Trânsito Brasileiro (CTB), lançado em 22 de janeiro de 1998 como um instrumento capaz de atemorizar os infratores e estancar a matança nas vias brasileiras, completou oito anos ontem em passo acelerado para o descrédito.
O problema talvez resida na carência de instrumentos repressivos capazes de fazer valer a lei. Apenas um em cada 50 motoristas gaúchos passíveis de ter a licença suspensa por delitos graves de trânsito ou excesso de pontos na carteira foi efetivamente punido em 2005. Os demais continuam transitando pelas vias, simplesmente porque as autoridades não têm gente para analisar os processos.
Conforme o Departamento Estadual de Trânsito (Detran), cerca de 82,5 mil motoristas autuados nos últimos três anos por crimes graves (como embriaguez ao volante) ou com mais de 20 pontos na carteira poderiam ter tido a carteira suspensa. Mas só 1,5 mil deles, aqueles suspeitos de dirigir alcoolizados, tiveram processos analisados pelo Detran. Os milhares de suspeitos de cometer outros 17 tipos de infrações continuam sem análise dos seus casos.
A parte arrecadatória – aplicação de multas – vai bem. Foram 1,2 milhão de autuações em 2005, o que garante bom faturamento ao Estado e surte efeito pedagógico aos infratores. O problema acontece quando os motoristas resolvem questionar a punição. Quem comete infrações no trânsito tem três chances de recorrer da multa e duas outras chances de recurso, antes de ter sua carteira cassada (veja quadro).
– Os recursos fazem parte do processo democrático, mas advogados especializados transformaram a protelação do pagamento de multas num método – afirma João Batista Hoffmeister, diretor-técnico do Detran.
O que dizem os especialistas
Especialistas não têm dúvidas de que a existência de no mínimo 81 mil motoristas autuados por graves infrações transitando nas ruas e estradas do Rio Grande do Sul estimula a sensação de impunidade.
– Os que se acham mais espertos, os infratores contumazes, acabam incentivados por esse emaranhado burocrático-jurídico. É preciso mais fiscalização preventiva, mais gente para acelerar julgamento de multas e processos e atualizar o valor das multas, que está defasado há uns cinco anos.
João Fortini Albano, doutor em transportes e vinculado ao Laboratório de Transportes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
– Leis, sem fiscalização, perdem força. Além disso, as mortes ocorrem muito por má qualidade das estradas, que é outra causa.
Cristine Nodari, doutora em segurança viária, da UFRGS
Mais acidentes e feridos
O número de acidentes e feridos no trânsito está em ritmo crescente, depois do impacto inicial do rigor do novo código, que poupou milhares de vidas nos dois primeiros anos de vigência. O total de feridos no Rio Grande do Sul, por exemplo, caiu de 18,8 mil em 1997 para 14,8 mil em 2000 e, quatro anos depois (em 2004, último dado disponível), superou 20 mil no ano.
Apenas o número de mortos se mantém estável, o que está longe de ser um consolo – a expectativa inicial era estancar ou reduzir as mortes por força de uma lei mais severa. Mesmo o aumento anual da frota (que cresce 210 mil veículos por ano no Rio Grande do Sul) não explica o crescimento de acidentes, já que a frota continuou crescendo nos anos em que os desastres diminuíram.