A tríplice coroa dos petistas

Oct 15 2007
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Correio Braziliense, 14/10/2007

Leandro Colon – Da equipe do Correio

Com a licença de Renan, PT fica com as presidências do Senado, da Câmara e da República. Mas sabe o ciúme que irá causar

Na gíria do futebol, a “tríplice coroa” é o termo dado ao time que conquista três títulos importantes. Em 2003, por exemplo, o Cruzeiro conquistou o campeonato mineiro, a Copa do Brasil e o Brasileirão. No futebol, isso é motivo de festa para quem ganha. Na política, nem tanto. Pode ser motivo de ciúme e rompimento. No curto prazo, o PT terá as presidências do Senado, da Câmara e da República. Nada mal para um partido que, há um ano, não comandava os dois primeiros e trabalhava para tentar se manter no terceiro.

O problema é a conseqüência disso. Aliados e oposição estarão de olho nos passos do PT a partir de amanhã. A licença de Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado abre caminho para o partido assumir a vaga por, pelo menos, 45 dias com Tião Viana (PT-AC). O PT comandará, ao mesmo tempo, a Câmara com Arlindo Chinaglia (PT-SP) e o Palácio do Planalto, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Será a primeira coincidência desse tipo desde o governo de José Sarney (PMDB-AP), no final da década de 1980, quando o PMDB tinha os três cargos nas mãos.

Publicamente, o PT nega, mas nos bastidores os petistas admitem o desejo de tentar efetivar Viana no cargo, caso Renan renuncie à presidência. O próprio senador alagoano avalia com amigos que não deve reassumir a cadeira de presidente. E já trabalha para escolher o sucessor. O preferido de Renan é o senador Sarney.

Com a renúncia de Renan, uma nova eleição terá que ser convocada, provavelmente no início do ano que vem. Para mostrar que Viana tem condições de ser o escolhido, o PT aposta na pacificação do Senado e na aprovação da prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) com ele na presidência, mesmo que interinamente.

Numa estratégia que ainda contaria com o apoio de um recente adversário das urnas, mas amigo no passado político: o PSDB. O PT aposta na parceria tucana para tentar emplacar Viana. Os tucanos querem abortar os planos de Renan de pôr Sarney no seu lugar. E não vêem com maus olhos votar no petista.

Não seria um cenário inusitado. PT e PSDB trabalharam juntos para eleger Arlindo Chinaglia presidente da Câmara em fevereiro passado. Só que, naquela época, o PMDB estava junto. No Senado, ao que tudo indica, a cena será outra. O partido não sinaliza disposição de abrir mão da prerrogativa de indicar o presidente por ter a maior bancada.

Se o PT insistir e conseguir confirmar Viana no lugar de Renan, poderá transformar em colisão a coalizão do governo do presidente Lula. O partido sempre foi visto como ambicioso e centralizador no governo. É criticado por aliados por tentar monopolizar a indicação de cargos em estatais. Sem falar na coordenação política. PT e aliados disputam desde 2003 o bastão da articulação do governo. Alguns petistas, por exemplo, tentam ignorar Walfrido dos Mares Guia (PTB) no ministério de Relações Institucionais. E não escondem o desejo de substituí-lo a qualquer momento. Já estiveram no posto com José Dirceu e Tarso Genro.

Cautela

E como se comportará o partido no comando do Senado, da Câmara e do governo? Candidato à presidência do PT, o deputado José Eduardo Cardozo (SP) avalia com cautela o cenário. Não descarta que o partido tente levar adiante a presidência com Viana, mas acha que, por enquanto, não há motivos para tensão na base do governo. “É muito cedo para fazer um prognóstico. Isso não quer dizer desequilíbrio. Não é uma imposição do partido”, diz.

Já Beto Albuquerque (PSB-RS), vice-líder do governo na Câmara, não esconde o receio do resultado dessa “tríplice coroa” ao PT. “Isso pode pôr em risco a governabilidade, com a reação do PMDB. O poder encanta”, afirma.

Albuquerque fala pelo chamado “bloquinho”, grupo que reúne PSB, PCdoB e PDT. Irritados com a centralização petista, decidiram caminhar sozinhos. E sabem que têm pouca força no Senado para inibir o sonho petista. Torcem por uma rebeldia do PMDB.

O PMDB, aliás, é o principal temor do governo com a postura que o PT terá a partir de amanhã no comando do Congresso e do Palácio do Planalto. Peemedebistas acompanharão em cima do lance as jogadas petistas. Consideram remotas as chances de o partido topar um acordo para eleger Viana no lugar de Renan. E apostam no apoio de Lula para impedir a manobra do PT. Preocupado com uma eventual e natural rebelião do PMDB, Lula já deu sinais de que pode preferir ficar do lado de Sarney ou de algum outro nome indicado pelo PMDB.

Isso (as três presidências) pode pôr em risco a governabilidade, com a reação do PMDB. O poder encanta.

Beto Albuquerque (PSB-RS), vice-líder do governo na Câmara

O número 45 dias. É o período de licença de Renan Calheiros da presidência do Senado