A (des)construção do Parlamento
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[12/09/2005]
A denúncia de cobrança de propina feita por um empresário contra o presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti, é mais um ato infame da longa história da corrupção no Brasil. Pelo menos desde 1822, a corrupção se mistura a atos públicos e privados. Desvirtua a função do Estado e perverte a prática política. De forma sistêmica, beneficia a muito poucos e prejudica a ampla maioria dos brasileiros. É uma forma de privatização do Estado.
No caso de Severino, sabemos quem são os responsáveis. Trezentos deputados votaram no atual presidente, como forma irresponsável de impingir uma derrota ao governo Lula. O que praticaram, na verdade, foi um ato de desatino político, que resultou em prejuízos ao país e à imagem do próprio Parlamento.
A possibilidade de cassação de Severino abre de vez a porteira para que venham a perder o mandato todos os deputados envolvidos direta ou indiretamente com o mensalão, caixa 2 e outras formas de corrupção.
Mas a seqüência de escândalos não deve paralisar a sociedade brasileira, nem interromper o seu desenvolvimento econômico e social. Tampouco fazermos descrer da política. Isso seria o pior dos retrocessos. Há temas fundamentais a enfrentar, como os gargalos de infra-estrutura, as mazelas sociais e o acesso reduzido à educação.
Para vencer esses desafios, dependemos da política, como espaço de mediação com a sociedade e de ação governamental. Por isso, da crise atual deve surgir um novo modo de fazer política no país. Esse é um processo gradual, que depende de cada cidadão.
Na sociedade da informação, já não basta votar. Além disso, o cidadão precisa compreender que é responsabilidade de cada um de nós co-governar. A construção da democracia não é algo que se terceiriza. O seu conceito moderno caracteriza-se pelo envolvimento das pessoas com os temas que importam à sociedade.
Neste momento de crise política, alguns desses temas são o aperfeiçoamento do sistema político e eleitoral, o combate à corrupção e à desigualdade, a radicalização da democracia e o aumento do controle popular sobre os governos. Essas são bandeiras históricas da esquerda em todo o mundo, pelas quais o PSB e nós, socialistas, seguiremos lutando.
Um bom começo para depurar a política brasileira é criar novas regras eleitorais. A eleição no Brasil virou superprodução milionária que favorece candidatos com poder econômico. Marqueteiros e tesoureiros tornaram-se mais importantes que o candidato e suas idéias. É preciso reduzir o custo e o período das campanhas para, no máximo 30 dias, proibir showmícios e padronizar programas de TV. Ao mesmo tempo, é urgente uma reforma política mínima que, pelo menos, valorize a fidelidade partidária e torne mais transparente o financiamento de campanha.
Como Sartre, que defendia a indignação como premissa básica da existência e do fundamento da liberdade do homem, acredito que não há outra saída para a crise que vive a sociedade brasileira que não passe pela via democrática, pela força da cidadania, pela valorização da ética coletiva e do aperfeiçoamento das instituições.