Cresce rigor contra condutor embriagado
- Posted by: Ass. Imprensa
- Posted in Beto na Mídia
- Tags:
Zero Hora – Porto AlegreZero Hora – Porto Alegre, 19/01/2006
Cresce rigor contra condutor embriagado
Projeto aprovado pela Câmara reforça papel da testemunha no processo
RODRIGO CAVALHEIRO*
Motoristas bêbados que se negam a fazer o teste do bafômetro podem estar mais perto da punição. A Câmara Federal aprovou ontem uma lei que dá ao depoimento de testemunhas o peso de prova de embriaguez ao volante. Na prática, caso um motorista se recuse a passar por testes de consumo de álcool, a palavra de um agente de trânsito ou de um policial servirá de prova decisiva.
Para vigorar, a proposta, já aprovada no Senado, irá à sanção do presidente da República. Atualmente, condutores escapam da punição valendo-se do seguinte argumento jurídico: submeter-se ao bafômetro é produzir prova contra si.
– Isso protege motoristas que, embriagados, causam mortes. O valor deste projeto é criar alternativas para enquadrar o culpado, sem contrariar a lei ou ferir o direito individual – explica o deputado gaúcho Beto Albuquerque (PSB), autor da lei.
O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) admite apenas o exame de sangue como prova de embriaguez. De acordo com o deputado, com a lei o infrator bêbado terá sua condição comprovada por testemunho, caso se recuse a se submeter ao bafômetro ou ao exame de sangue. A mudança valeria não só para casos de acidentes, mas também para barreiras policiais de rotina.
A novidade foi recebida com cautela pelo juiz Luiz Renato Alves da Silva, titular da 1ª Vara de Delitos de Trânsito da Capital:
– A simples palavra de um agente não é suficiente, pois é a dele contra a do réu. Se não tem laudo, como vai se dizer que ele está embriagado? – diz.
Pelo projeto de lei, a embriaguez poderá ser comprovada por "notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor". Para o advogado Paulo Ponzi, que atuou por cinco anos com recursos de trânsito, o ideal seria levar o condutor a um hospital, para que um médico atestasse a situação com um exame clínico.
O projeto agrava a pena nos acidentes causados por condutores embriagados. Quando o homicídio culposo (sem intenção) for cometido na direção de um veículo, a pena de dois a quatro anos de detenção é aumentada de um terço à metade.
* Colaborou Mirella Nascimento
( rodrigo.cavalheiro@zerohora.com.br )
O que a proposta muda
Como é
O CTB admite apenas o exame de sangue como prova de embriaguez (acima de seis decigramas de álcool por litro de sangue)
A pena para homicídio culposo na direção é detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a habilitação. A pena é aumentada de um terço à metade se o condutor não tiver permissão ou habilitação para dirigir
Como fica
No caso de recusa do condutor à realização de testes, a infração poderá ser caracterizada mediante obtenção de outras provas, pelo agente de trânsito, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou topor, resultantes do consumo de álcool ou entorpecentes
A pena é aumentada de um terço à metade se o condutor estiver sob influência de álcool ou outras drogas
Luiz Afonso Senna, secretário de mobilidade urbana da Capital
"É uma boa medida, pois auxilia o poder público. O grande problema hoje é que a Constituição não força as pessoas a usarem o bafômetro. Somos cobrados sem ter o instrumento. Se (a lei) reforçar o papel da testemunha, melhor. Vai aumentar a participação do agente. Hoje, ele leva até a delegacia e depois não temos como prosseguir."
Nei Pires Mitidiero, juiz aposentado e advogado especialista em delitos de trânsito
"O que muda é que os agentes poderão aplicar multa e suspensão do direito de dirigir com base em prova testemunhal. Além disso, há o aumento da pena no delito de embriaguez, o que é muito positivo. A prova testemunhal já ocorre e vem sendo aceita por juízes. Ninguém será obrigado a se submeter a exame de sangue ou bafômetro."
Diza Gonzaga, presidente da Fundação Thiago Gonzaga
"Para nós, dá mais garra para trabalhar. Não acho que vá acabar com a impunidade, mas para quem trava uma luta é um alento. Tem como fazer com que o juiz olhe com olhos de não impunidade. A sociedade vai estar atenta, se tem a lei a gente vai em cima. Hoje não tem como, é uma vergonha."
Trânsito
"Nossa palavra não vale nada"
Entrevista: Roberto Godoy Vianna, policial civil
Há 35 anos, o policial civil Roberto Godoy Vianna, o Carioca, testemunha a impunidade de motoristas alcoolizados. O servidor da Delegacia de Delitos de Trânsito revela o que espera da nova lei e conta sua experiência:
Zero Hora – A lei aprovada pode acabar com a impunidade de bêbados ao volante?
Vianna – Muda tudo. Sentimos que nosso trabalho é feito à toa. A Brigada prende, corre risco e, quando o motorista chega aqui, goza da nossa cara.
ZH – Ri da polícia?
Vianna – Tem cara que chega aqui, bate a cara na porta de vidro da delegacia, vomita, urina, tira a roupa e faz uma fiasqueira… Vai fazer o exame e o laudo diz que "não há traços de embriaguez". É uma vergonha.
ZH – Isso é comum?
Vianna – Hoje (ontem), mandei dois totalmente embriagados para a perícia, com todo o público vendo a fala enrolada deles. Tem cara que quebra tudo, desacata policiais. Hoje, nossa palavra não vale nada.
ZH – A lei fará o juiz levar em conta o teu testemunho?
Vianna – Vai depender do juiz, mas assim não pode ficar. Eu gosto de ser polícia, mas na hora de enquadrar as pessoas todo o trabalho cai por água baixo. O pior é que as pessoas que estão na rua estão correndo risco.