Governo retém 60% de fundo voltado à segurança no trânsito para garantir superávit
- Posted by: Ass. Imprensa
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Contas Abertas, 19/03/2008
Apesar do aumento considerável do número de acidentes nas rodovias do Brasil, causados muitas vezes pela imprudência dos motoristas, parte dos recursos que deveriam ser aplicados em ações voltadas à segurança no trânsito permanece bloqueada nos cofres públicos, sem utilização. Para este ano, a previsão era de que R$ 160,3 milhões, oriundos do Fundo Nacional de Segurança e Educação do Trânsito (Funset), fossem aplicados em melhorias para frear o número de acidentes. Desse total, no entanto, cerca de 60% estão bloqueados, devido aos limites impostos pelo setor econômico do Executivo. Isso significa que R$ 95,5 milhões, que poderiam ajudar a salvar vidas, servirão para garantir o superávit primário do governo no fim do ano.
De acordo com dados do Ministério da Saúde, os acidentes de trânsito aumentaram 9% em três anos no Brasil. Estimativas da Comissão de Trânsito da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) demonstram que cerca de 34 mil pessoas morrem por ano nas vias e estradas de todo o país. O número de feridos, por sua vez, ultrapassa os 400 mil. Segundo estimativas da agência governamental, os gastos públicos com acidentes de trânsito chegam a R$ 28 bilhões.
Foi exatamente com a meta de mudar esse triste quadro que, em 1998, foi criado o FUNSET, fundo de âmbito nacional que está vinculado ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). O objetivo era de garantir recursos no orçamento federal para ações voltadas à segurança no trânsito e à conscientização dos motoristas. Para tal, ficou estabelecido que, do total arrecadado em multas de trânsito no país, 5% devem ir para o Funset. Embora o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) estabeleça que todo recurso oriundo de multas deva ser aplicado em prevenção, sinalização, policiamento e educação no trânsito, no caso do Fundo, parte do dinheiro vem servindo para garantir metas fiscais.
Como se não bastasse os limites impostos pelo setor econômico do governo, da parcela que estaria teoricamente “disponível” para ser aplicada – R$ 64,8 milhões – apenas 37,1% saíram efetivamente dos cofres, a menos de três meses do término do ano (veja tabela). De janeiro até o último dia 10, apenas R$ 24,1 milhões oriundos do Funset foram aplicados em ações educativas e de segurança no trânsito. Do montante desembolsado, a maior parte – R$ 18,9 milhões – serviu para a implantação de melhorias no Sistema de Informações do Sistema Nacional de Trânsito. Outros R$ 3,7 milhões arcaram com ações de educação e cidadania, além da veiculação de campanhas voltadas à conscientização dos motoristas.
Das oito atividades atendidas pelos recursos do Funset, três delas não receberam sequer um centavo. Para a implantação e integração dos sistemas de dados e informações, este ano, por exemplo, estavam previstos em orçamento R$ 3,4 milhões. Desses, no entanto, nada foi efetivamente gasto. O mesmo ocorreu com as ações de fomento a projetos voltados à redução de acidentes e de melhoria da fiscalização feita pelos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito. Para essas atividades estavam previstos R$ 1,4 milhão.
Enquanto o dinheiro permanece parado no Fundo, a imprudência nas ruas faz crescer os acidentes. Só esta semana, pelo menos 30 pessoas morreram em dois grandes desastres no trânsito ocorridos em Santa Catarina e no Distrito Federal, os quais ganharam grande repercussão na mídia. De acordo com dados do Ministério da Saúde, em 2002, 32.753 pessoas morreram vítimas de tragédias no trânsito, enquanto que, em 2005, os registros de óbitos chegaram a 35.753. Uma redução de 3 mil mortes, o que seria, segundo o órgão, resultado do novo Código de Trânsito Brasileiro, implantado em 1998. Uma prova de que boas ações implementadas pelo poder público geram resultado e podem salvar vidas.
Durante a Semana Nacional de Trânsito, que ocorreu em meados do mês de setembro, a Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro, da Câmara dos Deputados, pediu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva a aplicação integral de R$ 1,2 bilhão que estariam, segundo a Frente, disponíveis no Funset em segurança e educação no trânsito. O presidente da Frente, deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), acusa o governo de estar se “apropriando indevidamente” dos recursos do Fundo, ao não incluí-los no Orçamento Geral da União para o Denatran.
“Existe esse enorme saldo contábil no Funset, sem que se possa gastar um centavo em ações para um trânsito mais seguro. O Denatran é hoje um órgão amarrado, pois o dinheiro está contingenciado, não está no Orçamento e, sim, no caixa comum do governo”, critica Albuquerque. Segundo o deputado, para mudar o quadro atual e reduzir as mortes no trânsito é necessário uma maior aplicação em infra-estrutura e em ações de conscientização da população. Na ocasião das festividades da Semana Nacional do Trânsito o ministro das Cidades, Márcio Fortes, disse que o governo, por meio do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, está debatendo com o Legislativo uma introdução progressiva no Orçamento desses valores do Funset.
O ministro descartou de prontidão a possibilidade de introduzir de uma só vez todo o dinheiro disponível no Fundo no orçamento do Denatran, mas garantiu que já existe um consenso sobre o assunto no governo, o que possibilitará a introdução de parte do dinheiro no planejamento de aplicações do próximo ano. Os parlamentares da Frente em Defesa do Trânsito Seguro garantem que estão trabalhando para pressionar o governo e incluir por meio de emendas parlamentares ao Plano Plurianual (PPA 2008-2011) medidas que garantam a aplicação mais eficiente dos recursos do Funset. A partir do próximo mês, a Frente dará início a uma campanha educativa em parceria com a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) que distribuirá 10 milhões de cartilhas com os “Dez Mandamentos do Trânsito” a todas as paróquias brasileiras.
Mariana Braga
Do Contas Abertas