O baixo clero vai ao Paraíso
Feb
28 2005
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- Posted by: Ass. Imprensa
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Zero Hora
Zero Hora, 27/02/2005
O baixo clero vai ao Paraíso
Grupo que sustenta a nova Mesa vive dias de glória e tenta impor suas próprias prioridades ao resto da Câmara. Até pouco tempo alijado das decisões políticas na Câmara, o chamado baixo clero – massa de deputados sem maior expressão política que impulsionaram a candidatura do atual presidente da Casa, Severino Cavalcanti (PP-PE) – já age com desenvoltura.
Eles formam a trincheira que cerca seu novo líder, evitando que Severino fique acuado perante as críticas à plataforma conservadora e fisiológica que o elegeu.
Quem sustentava que a vitória de Severino não alteraria em nada a rotina e os costumes da Casa foi desmentido na quarta-feira. Na primeira reunião do colégio de líderes, o pernambucano apareceu acompanhado de cerca de 50 colegas. O grupo estava presente com o intuito de patrulhar os líderes que se apresentassem contra o aumento de R$ 12,8 mil para R$ 21,5 mil nos salários dos parlamentares.
O baixo clero se movimenta nos bastidores, tentando contrabalançar o temor disseminado na Câmara sobre o impacto que o reajuste teria nas eleições de 2006. Para isso, a turma de Severino corre contra o tempo, apostando em uma aprovação da medida ainda no primeiro semestre.
A pressa, entretanto, deverá entrar em choque com o realismo de boa parte dos deputados. O reajuste praticamente dobra o salário que os parlamentares recebem hoje para trabalhar de terça a quinta-feira em Brasília – nos outros dias, costumam voltar a seus Estados.
– Quem votou em Severino para amealhar vantagens correrá o risco de não se reeleger – ameaça o deputado Beto Albuquerque (PSB), vice-líder do governo.
PT já tem estratégia para nova situação
Apesar de os deputados Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) e Virgílio Guimarães (PT-MG) – candidatos petistas derrotados por Severino – também terem defendido aumento de salários em suas plataformas, a questão do reajuste deverá pautar a primeira queda-de-braço entre o baixo clero e seus opositores, a maioria eleitores de Greenhalgh. O PT já tem até estratégia para conter a medida e pretende tirar proveito da polêmica, como forma de diminuir o impacto da derrota infligida por Severino.
A divisão existente na Câmara ameaça paralisar os trabalhos. Severino já se posicionou contra a reforma política, que prometia corrigir distorções como a infidelidade partidária. Ao mesmo tempo, o PT não tem interesse, às vésperas da campanha pela reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de colocar na agenda política temas como a reforma trabalhista e a autonomia do Banco Central. Nesse quadro, a Câmara se concentraria em limpar a pauta e votar as medidas provisórias pendentes, como a MP 232 e o projeto de Lei da Biossegurança.
Severino também já mostrou que não terá receio de afrontar o Planalto. Na primeira semana, se posicionou contra relação a MP 232, que aumenta tributos de prestadores de serviços, e prometeu pôr em votação a PEC paralela da Previdência, que reduz os efeitos da reforma sobre o funcionalismo público.
Presidente quer estender benesses
– Apesar de folclórico, Severino deu encaminhamento à MP 232. E conseguiu não colocar o governo em uma enrascada em relação ao assunto, ao mesmo tempo que contemplou os críticos. Dificilmente Greenhalgh teria a mesma desenvoltura – comemora o deputado Luis Carlos Heinze (PP), um dos líderes da bancada ruralista.
A sintonia em relação à MP 232 deverá unir mais o novo presidente e a bancada ruralista, interessada na aprovação do projeto de Lei de Biossegurança. Nos bastidores, já se negocia a votação do projeto sem o artigo que libera as pesquisas com células-tronco, medida à qual Severino é radicalmente contrário por motivos religiosos.
– Política se faz pelo momento. E o momento atual é bem negativo para o PT – filosofa o deputado Augusto Nardes (PP).
Com apoio dos ruralistas e da trupe que o elegeu, Severino defenderá o lema do baixo clero – “Todos são iguais na vida e no parlamento”. O novo presidente vai brigar para que a maioria anônima da Câmara passe a ter uma atuação digna da elite: terão mais espaço na TV Câmara e deverão entrar no seleto grupo dos deputados que fazem viagens internacionais pagas pelo contribuinte. Severino ainda prometeu defender o recesso parlamentar de 90 dias e estreitar a relação de seu grupo com o Executivo.
Eles formam a trincheira que cerca seu novo líder, evitando que Severino fique acuado perante as críticas à plataforma conservadora e fisiológica que o elegeu.
Quem sustentava que a vitória de Severino não alteraria em nada a rotina e os costumes da Casa foi desmentido na quarta-feira. Na primeira reunião do colégio de líderes, o pernambucano apareceu acompanhado de cerca de 50 colegas. O grupo estava presente com o intuito de patrulhar os líderes que se apresentassem contra o aumento de R$ 12,8 mil para R$ 21,5 mil nos salários dos parlamentares.
O baixo clero se movimenta nos bastidores, tentando contrabalançar o temor disseminado na Câmara sobre o impacto que o reajuste teria nas eleições de 2006. Para isso, a turma de Severino corre contra o tempo, apostando em uma aprovação da medida ainda no primeiro semestre.
A pressa, entretanto, deverá entrar em choque com o realismo de boa parte dos deputados. O reajuste praticamente dobra o salário que os parlamentares recebem hoje para trabalhar de terça a quinta-feira em Brasília – nos outros dias, costumam voltar a seus Estados.
– Quem votou em Severino para amealhar vantagens correrá o risco de não se reeleger – ameaça o deputado Beto Albuquerque (PSB), vice-líder do governo.
PT já tem estratégia para nova situação
Apesar de os deputados Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) e Virgílio Guimarães (PT-MG) – candidatos petistas derrotados por Severino – também terem defendido aumento de salários em suas plataformas, a questão do reajuste deverá pautar a primeira queda-de-braço entre o baixo clero e seus opositores, a maioria eleitores de Greenhalgh. O PT já tem até estratégia para conter a medida e pretende tirar proveito da polêmica, como forma de diminuir o impacto da derrota infligida por Severino.
A divisão existente na Câmara ameaça paralisar os trabalhos. Severino já se posicionou contra a reforma política, que prometia corrigir distorções como a infidelidade partidária. Ao mesmo tempo, o PT não tem interesse, às vésperas da campanha pela reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de colocar na agenda política temas como a reforma trabalhista e a autonomia do Banco Central. Nesse quadro, a Câmara se concentraria em limpar a pauta e votar as medidas provisórias pendentes, como a MP 232 e o projeto de Lei da Biossegurança.
Severino também já mostrou que não terá receio de afrontar o Planalto. Na primeira semana, se posicionou contra relação a MP 232, que aumenta tributos de prestadores de serviços, e prometeu pôr em votação a PEC paralela da Previdência, que reduz os efeitos da reforma sobre o funcionalismo público.
Presidente quer estender benesses
– Apesar de folclórico, Severino deu encaminhamento à MP 232. E conseguiu não colocar o governo em uma enrascada em relação ao assunto, ao mesmo tempo que contemplou os críticos. Dificilmente Greenhalgh teria a mesma desenvoltura – comemora o deputado Luis Carlos Heinze (PP), um dos líderes da bancada ruralista.
A sintonia em relação à MP 232 deverá unir mais o novo presidente e a bancada ruralista, interessada na aprovação do projeto de Lei de Biossegurança. Nos bastidores, já se negocia a votação do projeto sem o artigo que libera as pesquisas com células-tronco, medida à qual Severino é radicalmente contrário por motivos religiosos.
– Política se faz pelo momento. E o momento atual é bem negativo para o PT – filosofa o deputado Augusto Nardes (PP).
Com apoio dos ruralistas e da trupe que o elegeu, Severino defenderá o lema do baixo clero – “Todos são iguais na vida e no parlamento”. O novo presidente vai brigar para que a maioria anônima da Câmara passe a ter uma atuação digna da elite: terão mais espaço na TV Câmara e deverão entrar no seleto grupo dos deputados que fazem viagens internacionais pagas pelo contribuinte. Severino ainda prometeu defender o recesso parlamentar de 90 dias e estreitar a relação de seu grupo com o Executivo.
A maioria silenciosa da Câmara |
Segundo a consultoria Arko Advice, a Câmara dos Deputados é dividida em: |
Alto clero: cerca de cem dos 513 deputados federais. Têm influência por ocuparem liderança formal (assumem cargos importantes na Casa) ou informal (têm sólida carreira política e influenciam a opinião pública). |
Baixo clero: são pelo menos 400. Soldados rasos da Câmara, anônimos e controlados pelos líderes partidários, não participam de decisões, não aparecem na mídia e não têm influência política. Essenciais só na hora de votar, reivindicam mais espaço nas decisões depois da eleição para a presidência de um de seus representantes, Severino Cavalcanti (PP-PE). |
A rotina |
O dia dos deputados do baixo clero começa cedo. Como dificilmente têm reuniões marcadas fora da Câmara, são os primeiros a chegar. Circulam pelos gabinetes à procura do grupo de cem deputados que conta com maior prestígio, com quem eles fazem suas barganhas. |
Para garantir o quórum |
Como não tem trânsito nos gabinetes dos ministros, o baixo clero garante quórum no plenário. Está sempre na Câmara. |
Na telinha |
Deputados do baixo clero não têm intimidade com a tribuna. Só chegam perto dela às segundas e sextas-feiras, dias em que a Câmara fica quase às moscas. Mesmo sem platéia, aproveitam para discursar. É o jeito de aparecerem na TV Câmara. |
Onde não encontrá-los |
Nunca procure-os no Salão Verde, o corredor que dá acesso ao plenário da Câmara e onde os deputados dão entrevistas à imprensa. O baixo clero nunca aparece por lá. |
Filas para falar com líderes |
A barganha do baixo clero é voltada aos líderes partidários. Eles fazem fila nas portas dos gabinetes dos líderes. |
Ministros inacessíveis |
A relação do baixo clero com o poder em Brasília nunca existiu. Todos reclamam que nunca são recebidos pela maioria dos ministros. |
Os endereços |
Os apartamentos do baixo clero em Brasília são quase albergues de suas bases eleitorais. Os eleitores desembarcam em Brasília para fazer cursos e consultas médicas. Hospedam-se com os deputados e, não raras vezes, circulam em Brasília também às custas do erário. |
Despachantes de luxo |
Os gabinetes do baixo clero são como escritórios de despachante. Alijados da maioria das decisões mais importantes, eles brigam por liberação de verbas para seus redutos eleitorais. |
A origem do termo |
Na História, a denominação de baixo clero é aplicada à porção plebéia da Igreja medieval: |
Na Idade Média (dos séculos 5 a 15), período em que a Igreja Católica exerceu uma influência poderosa na Europa, um abismo social separava os quadros eclesiásticos. Os historiadores costumam dividir a Igreja dessa época em alto clero (papas, cardeais e bispos, geralmente de origem nobre, que viviam das rendas da instituição e participavam do jogo do poder) e baixo clero (sacerdotes de origem plebéia, que trabalhavam para garantir o próprio sustento, muitas vezes em tensão com o alto clero). |
O baixo clero teve um papel importante em episódios como a Revolução Francesa, quando se aliou à burguesia (proprietários e artesãos) contra a monarquia e a nobreza. |