Pont refuta dificuldades do PT para fazer aliança no Estado

Feb 22 2010
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JORNAL DO COMÉRCIO
Notícia da edição impressa de 22/02/2010

Guilherme Kolling e Gisele Ortolan

O deputado estadual critica o pragmatismo na negociação de alianças, com distribuição de cargos.


O novo presidente do PT no Rio Grande do Sul, deputado estadual Raul Pont, discorda da tese de que o partido está isolado no Estado e que terá dificuldades para obter aliados nestas eleições. O dirigente petista observa que outras pré-candidaturas ao Palácio Piratini – como a dos deputados Beto Albuquerque (PSB) e Luís Augusto Lara (PTB) – ainda não obtiveram apoios além de suas próprias siglas “e ninguém fala que eles estão isolados”.

O petista espera obter o apoio do PSB e do PCdoB – que integram a base do governo Lula (PT) e fazem oposição à gestão de Yeda Crusius (PSDB) -, mas não descarta fazer aliança com o PTB, que está no governo tucano. E ainda tem esperanças de que o PDT, ao menos em parte, participe da campanha de Tarso Genro, nome petista para o governo do Estado.

Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Pont fala que o partido vai defender uma proposta de desenvolvimento econômico para o Rio Grande do Sul, na linha do governo federal, com investimentos públicos. E refuta a tese de que o Estado precisa ser apaziguado para vencer o clima de polarização. Diz que o desafio principal é resolver os problemas, não mascará-los, submetendo-os a uma “falsa unidade”. Também critica o pragmatismo na negociação de alianças, com a distribuição de cargos em troca de apoio.

Jornal do Comércio – Nas últimas oito eleições com segundo turno no Rio Grande do Sul – incluindo o governo do Estado e principais prefeituras – o único partido que esteve em todas as disputas foi o PT. Mas só obteve uma vitória. Como o senhor analisa essa situação?

Raul Pont – O PT é o partido que mais cresceu de 1982 para cá e consolidamos isso com a vitória de Lula para a presidência. Há uma identificação crescente com o partido, mas isso é atrasado pelo sistema eleitoral com voto nominal não partidário, que distorce a representação política. Com isso, o poder econômico, o processo da indução corruptora que o sistema estabelece, corrói todos os partidos, inclusive o nosso. A disputa individualizada é um atraso para a democracia. O voto nominal é antidemocrático, anacrônico e não permite que se revele a identidade que a população tem com as eleições executivas.

JC – Por exemplo?

Pont – Em 2006, Lula venceu com 50 milhões de votos e a base legislativa do primeiro turno não passa dos 15 milhões de votos. Não é possível que mais de 30 milhões de eleitores não saibam fazer distinção. E com isso, substitui-se o programa pelo pragmatismo, pela troca do voto, por um favor, todos esses mecanismos de relação pessoal que são despolitizados. Isso é um atraso ao País. A ausência de uma reforma política eleitoral é a pior coisa que vivemos, porque corrói os partidos e o sistema legislativo – não há fidelidade partidária.

JC – Retomando a questão original, como o PT pode reverter o quadro das últimas eleições no Estado, em que o partido foi derrotado pelo voto anti-PT?

Pont – Combatendo o preconceito. Dizem que estamos isolados e que somos arrogantes. Mas onde é que tem arrogância? Fizemos um encontro estadual, definimos uma prioridade de alianças, na festa (dos 30 anos do PT) estavam sete ou oito partidos presentes, alguns já dizendo de antemão que querem fazer aliança conosco. Nenhum outro partido fez um encontro como o nosso e definiu uma política de alianças como fizemos. Agora, se uma legenda não quer fazer aliança conosco, o que dá o direito de dizer que somos arrogantes? É evidente que, se somos oposição a esse governo, não podemos sentar com o DEM ou PSDB para governar em seguida.

JC – E o PTB, que integra o governo Yeda?

Pont – Desde o encontro estadual, de forma aberta, transparente, aprovamos a proposta de uma coalizão com PDT, PCdoB e PSB (que apoiam o governo federal e não estão no governo do Estado). E dissemos que isso estava aberto ao debate com outros partidos – claro, existem os pequenos que não têm representação parlamentar e que não estão no governo Yeda, PV, PRB, PTdoB, PMN. É evidente que com eles estamos conversando. E vamos conversar com P-Sol, PSTU, todos partidos da oposição. Agora, partidos que estão no governo Lula, mas que aqui sustentam o projeto ao qual somos oposição, depende do desdobramento. Se continuam no governo Yeda, como vamos constrangê-los a sair de um projeto para fazer coligação conosco? É um desrespeito. Isso sim seria arrogância. Os partidos optam por políticas por livre e espontânea vontade.

JC – Ou seja, será difícil compor com PTB.

Pont – Lara se lançou candidato. Tivemos uma longa conversa e ele me disse: “Olha, estamos no governo Lula, não temos disposição de sair por enquanto do governo Yeda, mas a nossa posição é de candidatura própria no primeiro turno”. Não posso passar por cima, seria prepotente.

JC – O PDT já está praticamente fechado com o candidato do PMDB, José Fogaça. Beto Albuquerque não quer nem ouvir falar em ser candidato a vice ou senador. Tendo em vista esse contexto, o PT terá, na melhor das hipóteses, uma aliança com o PCdoB?

Pont – O PDT já decidiu que vai apoiar (a candidata do PT à presidência da República) Dilma (Rousseff) e aqui está na oposição ao governo Yeda. Bem, é meio caminho andado. Por que desistir dessa proposta se isso ainda não está encerrado? A direção nacional do PCdoB definiu apoio à Dilma e orientou que nos estados a política prioritária seja aliança conosco. Então, vamos continuar a discutir. Se, por ventura, não houver a candidatura de Ciro Gomes (PSB) à presidência da República, isso não muda a conjuntura em relação ao Beto e ao PSB no Rio Grande do Sul? Muda. Portanto, não posso, de antemão, dizer que as negociações já estão encerradas.

JC – Verifica-se muito pragmatismo nas negociações. O presidente da Assembleia Legislativa, deputado Giovani Cherini (PDT), chegou a afirmar que quer saber o que o PMDB vai oferecer para a aliança, porque o PT já teria garantido metade do governo.

Pont – Nossas decisões são transparentes e fruto de reuniões coletivas. Nossa política de alianças é com partidos com os quais temos identidade nacional e regional. A distribuição de secretarias é um segundo momento. Não podemos transformar processo eleitoral em balcão de negócios. Não teve essa oferta e nem teve a demanda. Se queremos que a população se eduque politicamente, não podemos adotar o toma lá, dá cá. Isso é a antipolítica. Nos dispomos a reunir um conjunto de partidos e estabelecer compromissos até de décadas. Mas compromissos programáticos. Gostaria de uma coligação com PCdoB, PSB, PDT para governarmos o Estado por 30 anos. Mas em cima de um programa que “queremos prioridade na educação, queremos democracia participativa.” Sentar para discutir um projeto para o Estado. Nenhuma coalizão faz mudanças significativas a não ser no longo prazo. Então, estamos dispostos a formar um bloco sólido, de longo prazo. É uma prova de que não somos arrogantes, queremos comprometer o futuro, mas não de forma leiloada.

JC – Após a derrota de Maria do Rosário (PT) nas eleições de 2008, o deputado Adão Villaverde (PT) disse que o PT precisava sair do isolamento. A possibilidade de uma chapa pura nesta eleição não fortalece essa imagem?
Pont – Não concordo com essa tese de isolamento. A situação do Lara é igual à nossa ou pior, a situação do Beto é igual ou pior, a situação do PCdoB é igual ou pior. Yeda também está isolada. E eles nunca são chamados de isolados ou arrogantes. Só nós. Que mistério é esse? O País tem eleições em dois turnos porque tem um sistema plural, que dificulta que o vitorioso tenha, além da maioria, legitimidade de ter chegado aos 50% dos votos. Então, essa tese de que o PT está isolado não se sustenta porque hoje todos os candidatos não têm uma base sólida e ampla de apoio. Poderão construí-la até o dia do registro. Mas isso vale para nós também.

JC – Qual o projeto do PT para o Estado?

Pont – Apostar em um projeto de desenvolvimento econômico, mostrar como é possível ter medidas do governo regional que se materializem em crescimento econômico, coisa que não ocorre com o déficit zero. Queremos apostar primeiro na capacidade de o Estado voltar a crescer com um conjunto de medidas que são possíveis de serem realizadas pelo Estado, e apresentar a necessidade da sintonia com o governo federal. E não é um problema de “ah, não ocorre porque o partido é diferente, aqui o governo é do PSDB e foi perseguido”.

JC – Então não há nenhuma diferenciação?

Pont – O (governador) Aécio Neves (PSDB), por exemplo, aproveitou os programas do governo federal para Minas Gerais. O próprio (governador de São Paulo) José Serra (PSDB) também. Quer dizer, o problema não é do PSDB, é do governo Yeda e seus apoiadores. Todas as áreas do governo perdem recursos por problema de gestão, incompetência, arrogância.

JC – O senhor se refere a dinheiro do governo federal?

Pont – Essas coisas vão desde esse absurdo do tratamento da TVE em relação ao imóvel do morro, que o INSS tinha que vender e o Estado por birra não compra, iria gastar o dobro ou o triplo se fosse instalar em outro lugar – agora parece que já reconhece que o melhor é deixar lá e fazer um acordo com a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação), que comprou a área -, até recursos da Saúde, que não foram usados e estão disponíveis. Então, essas coisas não foram feitas por incapacidade gerencial. A falta de orientação pode condenar um governo em condições favoráveis a resultados pífios.

JC – As lideranças do PT também criticam os partidos da base da governadora, como é o caso do PMDB, que deve ser outro adversário do PT nesta eleição, com José Fogaça. Essa possibilidade de o PMDB apoiar Dilma Rousseff (PT), que teria dois palanques no Estado, não pode prejudicar a estratégia de campanha?

Pont – A ligação da candidatura de Tarso com Dilma e Lula é largamente identificável. Se o PMDB do Rio Grande do Sul ou Fogaça realmente assumirem a candidatura de Dilma, não vemos conflito nisso. Não há problema de a Dilma aqui ter dois palanques. Quem mais terá que dar explicações é o candidato (Fogaça) ou o partido (PMDB), porque quem sustentou o governo FHC foram eles, quem está com o governo Yeda é o PMDB.

JC – Mas se Tarso criticar Fogaça pelo fato de o PMDB integrar o governo Yeda, que perdeu recursos do governo federal, Fogaça poderá afirmar que está aliado a Dilma e que em seu governo isso não irá acontecer. A tese do PT não perde espaço?

Pont – A apropriação oportunista de um governo que se combateu existe, é política, pode acontecer. Confiamos que o eleitor tenha discernimento para se dar conta de que isso não é sincero, de que é uma atitude hipócrita. O PMDB não aplicava o Orçamento Participativo (OP) em nenhuma cidade que governava; Fogaça, depois de eleito (em Porto Alegre) vem desmontando o OP. Mas isso não impediu que eles, na campanha eleitoral, de maneira falaciosa, dissessem que “o que é bom fica”, o OP vai continuar. Não continuou, manteve-se um simulacro, que a cada ano tem menos dinheiro, decide menos, incide menos para as políticas públicas. Bem, mas a população acreditou que Fogaça continuaria tudo o que é bom e melhoraria o que é ruim. Ele conseguiu até se reeleger com o seu discurso. Mas você engana uma, duas, três vezes, não engana vinte. Vamos fazer uma campanha propositiva, de um projeto de desenvolvimento econômico. Não partilhamos dessa tese de que o problema do Rio Grande é de que aqui há muito radicalismo.

JC – A chamada polarização entre governo e oposição?

Pont – Isso é uma farsa que, primeiro, não resiste à mínima pesquisa histórica. O Rio Grande do Sul tem sistema bipartidário desde 1945. Até 1966, todas as eleições tinham o PTB e de outro lado os outros partidos. Depois, Arena e MDB levaram mais 20 anos. E de 1982 para cá, a polarização do PDS (hoje PP) com o PMDB foi substituída pela aliança deles contra nós (PT). Portanto, é a cultura política do Estado. Naturalmente ela é tensa, leva a uma discussão. Então, se é para apaziguar os ânimos, vamos fechar o Inter e o Grêmio, acabar com a polarização em vários aspectos da vida cultural, como se isso fosse um defeito. Talvez o grande campeão desse discurso da unidade seja o (senador) Pedro Simon (PMDB); foi a forma de ele disfarçar o seu direitismo, de estar sempre do lado dos ricos e poderosos disfarçado de democrata ou de esquerda. Olha, é impossível, em uma sociedade de classes, onde existem grandes fazendeiros e os sem-terra, dizer que se resolve o problema apelando para a unidade.

JC – De que forma o projeto do PT para o Estado será igual ao federal?

Pont – O governo federal aposta no crescimento econômico acelerado, no Estado incentivador, que aumenta salário, distribui renda, gera emprego, mercado, consumo. Temos aqui um governo aprisionado ao déficit zero. É uma preocupação tecnocrática, contábil. E essa não é a linha nacional do PSDB. O governador de São Paulo, José Serra, mantém uma política de piso regional bem superior ao nacional. Aqui, em três anos de governo Yeda, se liquidou com o piso regional.

JC – E a transferência de votos?

Pont – Se Lula for para o palanque com mais de 80% de popularidade e apontar a candidata, mesmo que este percentual não seja automático, pesará muito.

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